Empresas chegam a ficar meses com vagas abertas a procura de bons profissionais por causa da falta de qualificação e até de interesse pela profissão, afirmam empresários
A Flamboyant Materiais de Construção está com três vagas abertas para motorista há seis meses. “Isso porque estamos fazendo teste com uma pessoa, mas eram quatro vagas”, conta o gerente da loja, Sílvio Brandão. Segundo ele, isso tem causado muitos transtornos à empresa, pois ocorrem atrasos nas entregas e os clientes reclamam muito. “A pessoa compra hoje e já quer receber amanhã. Se atrasa dois ou três dias, ela quer desistir da compra”, informa.
Para Sílvio, o problema atinge desde pequenos lojistas até grandes transportadoras. Ele acredita que o setor de material de construção tenha um dos melhores salários, que chega a R$ 1.600,00 mensais, pois o profissional ainda recebe horas extras e benefícios como cesta básica, plano de saúde e comissões. Mesmo assim, dos 17 caminhões da empresa, 6 estão parados. “Hoje, o trabalhador está podendo escolher mais e não quer trabalhar muito, principalmente nos fins de semana”.
Problema semelhante enfrenta o empresário Lincoln Augusto Lopes, proprietário da empresa de transporte de cargas pesadas Translincoln Logística. Ele está com cinco vagas abertas e reclama que faltam profissionais qualificados. “Chego a ficar meses com vagas disponíveis. Falta gente responsável para trabalhar, que não beba, tenha paciência na estrada e cuide bem do caminhão”, afirma.
Os candidatos que aparecem geralmente são jovens e sem experiência na função. Para Lincoln, muitos motoristas migraram para outras profissões, como a construção civil, apesar do salário na transportadora ser atrativo: R$ 2.250,00 fixos mais R$ 50 de diária para viagem.
DÉFICIT
O Sindicato das Empresas de Transporte de Cargas e Logística de Goiás (Setceg) estima que, atualmente, o Estado tenha um déficit de 5 mil motoristas para os variados segmentos, inclusive transporte de passageiros, número que chega a 100 mil no País. O presidente do Setceg, Paulo Afonso Lustosa, lembra que, apesar da recente desaceleração da economia, houve um aumento do transporte de grãos.
A Lei 12.619, que regulamentou a jornada dos motoristas, também repercutiu na demanda por mão de obra, já que as empresas precisaram contratar mais motoristas. Para ele, essa escassez de profissionais é mais um ponto nos problemas logísticos que o País enfrenta e que encarem o frete e reduzem sua competitividade. “Se tivéssemos outros modais eficientes, essa pressão não seria tão grande”, acredita Paulo Afonso. Segundo ele, o salário de um motorista rodoviário hoje pode chegar a R$ 4 mil.
Com o mercado aquecido, muitos profissionais também preferem escolher vagas para trabalhar dentro da cidade, principalmente por causa da insegurança nas rodovias. “O romantismo das estradas acabou. Além disso, o transporte rodoviário têm exigências maiores, como mais qualificação e carteira categoria E”.
A Transportadora Veronese, especializada no transporte de cargas perigosas, como combustíveis, tem 15 vagas disponíveis para motoristas. Para a coordenadora de Desenvolvimento Organizacional da empresa, Adriana Neves, o principal empecilho à contratação é a falta de qualificação dos profissionais, já que o transporte de cargas perigosas exige cursos específicos, como o de Movimentação Operacional de Produtos Perigosos (Mopp).
Para conquistar uma vaga, além de ter o curso, o profissional também deve ter um perfil adequado para este tipo de transporte específico. “É preciso ser uma pessoa mais cuidadosa e tranquila para cumprir todas as normas de seguran- ça”, informa Adriana. Segundo ela, depois de passar pelo rigoroso processo seletivo, que leva cerca de dois meses, o candidato também é submetido a vários treinamentos em segurança e prática de direção.
TREINAMENTO
Hoje, a empresa, que atua em cinco Estados, emprega 400 motoristas, dos 80 em Goiás. “Antes de sair para uma rota sozinho, ele fica cerca de 30 dias em treinamento”, ressalta. O salário varia muito conforme a região do País, mas ela garante que está acima da média.
O diretor comercial da Cooperativa de Transporte de Petróleo, Derivados, Cargas e Passageiros (Coopertransp), João Batista da Silva, ressalta que as muitas exigências para o transporte de cargas perigosas seguem as normas da Agência Nacional de Petróleo (ANP). Além dos cursos, como direção defensiva e segurança do meio ambiente, o candidato precisa ter cinco anos de experiência e fazer treinamento. Por isso, algumas vezes demora para preencher as vagas disponíveis.
Entidade aponta causas
Hoje, muitas empresas têm procurado o Sindicato dos Trabalhadores em Transportes Rodoviários no Estado (Sindittransporte) oferecendo vagas para motoristas em todas as áreas, desde o transporte de cargas até o transporte coletivo. Para o vice-presidente do sindicato, Adedimar Gonçalves Ferreira, muitas vezes o salário e a jornada de trabalho não agradam o profissional. Outras vezes, faltam trabalhadores qualificados.
Segundo ele, o transporte coletivo sente fortemente este problema. “Os motoristas não querem mais trabalhar nos ônibus porque o trânsito da capital está muito pesado e não tem mais como cumprir os horários. Além disso, muitos reclamam do desrespeito de muitos passageiros”, justifica. O aumento da ocorrência de assaltos também tem afugentado os profissionais.
SALÁRIOS
Os salários melhoraram bastante nos últimos anos. Hoje, um motorista de ônibus iniciante recebe R$ 1.575,20 mais gratificação de R$ 127 e tíquete refeição de R$ 450. Com mais de um ano de casa, o salário sobe 3% e, depois de 10 anos, o motorista recebe 30% mais. “Mesmo assim, não estão achando quem queira”, diz. Somente a Rápido Araguaia tem, hoje, 30 vagas abertas para motoristas na Grande Goiânia.
Outros motoristas também rejeitam o transporte de cargas para não ficarem muito tempo longe da família e por temerem as condições de muitas estradas. Apesar do piso ser de R$ 1.080,00 para o motorista carreteiro, de R$ 915 para motoristas de carros e caminhões pequenos e de R$ 816 para motoristas entregadores do comércio, na prática muitas empresas acabam pagando mais para atrair mão de obra.
Por Lúcia Monteiro - O Popular
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